Risco de zika na Olimpíada é baixo, mas vale deixar kit com camisinha e repelente a postos

A Olimpíada do Rio é um evento histórico, mas o motivo da lembrança dele no futuro, de repente, pode não ser o espetáculo ou algum recorde, e sim a infame zika.

A doença desembarcou no país provavelmente em 2013, durante a Copa das Confederações, vinda de algum país da Ásia ou Oceania, e se espalhou como fogo em mata seca. A “prima pobre” da dengue –que raramente é grave– teria sido apenas mais uma virose por aí se não fossem os casos de microcefalia.

Olhando de longe, os números assustam. Desde o final de 2015 até agora, foram 8.703 casos notificados.

Desses, 1.749 foram confirmados –95 no Estado do Rio de Janeiro. Talvez não pareça muito, mas é. A cifra fluminense equivale a mais da metade dos registros anuais do país entre 2010 e 2014.

Nessa época, as más-formações se davam por infecção por outros vírus, uso de drogas e fatores genéticos. Hoje, a zika é, com larga margem, a principal causa.

Além da microcefalia, pode haver mais prejuízos causados pelo vírus em bebês. Os danos neurológicos nem sempre são notados. Pode haver calcificações no cérebro, degeneração da retina e surdez –tudo isso longe de ser mapeado.

De fato, estamos longe até de entender a natureza do surto de microcefalia. Há um desequilíbrio na incidência de casos no Nordeste do país e as explicações ainda estão no mundo das ideias. Entre elas, a presença de genes que favorecem a má-formação, a pobreza e as más condições de higiene e/ou a presença de outros vírus, como o da dengue (nossa eterna inimiga). Até um vírus bovino tem sido cogitado à vaga de “ajudante” do vírus da zika.

Mesmo assim, o destino parece estar a favor. A época do ano é a melhor possível com relação a zika, dengue e chikungunya –a transmissão pelo A. aegypti, provável principal via de contágio, está em um mínimo por causa do frio e do tempo seco. O vírus também se multiplica e se espalha devagar.

A chance calculada por Eduardo Massad, da USP, para que um turista gringo pegue zika é da ordem de 3 para cada 100 mil –15 no total, considerando os 500 mil aguardados.

Nessa conta, porém, o potencial da transmissão sexual da zika pode estar subestimado. Foram relatados casos dessa “modalidade” nos EUA e na Europa, onde não havia transmissão por mosquito. E, convenhamos, a atividade sexual humana depende menos da estação do ano do que a dos mosquitos.

Por ora, vale deixar o kit olímpico com repelente e camisinha a postos. O risco é mínimo, mas, se algum gringo tem de levar medalha de ouro, que não seja esse intruso asiático-africano do vírus da zika.


 

Essa foi a primeira de três colunas “olímpicas” sobre saúde de minha autoria que serão publicadas no caderno especial “Rio 2016”, da Folha. A primeira foi publicada hoje e as demais sairão nas duas próximas semanas, sempre às quartas. A versão on-line você poderá ler aqui no blog “Cadê a Cura?