Cadê a Cura? https://cadeacura.blogfolha.uol.com.br Sobre doenças e suas complicações e o que falta para entendê-las e curá-las Thu, 19 Mar 2020 00:39:51 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Cientistas lançam observatório de Covid-19 no Brasil em tempo real e dizem que casos podem chegar a 1.600 em quatro dias https://cadeacura.blogfolha.uol.com.br/2020/03/18/cientistas-lancam-observatorio-de-covid-19-no-brasil-em-tempo-real-e-dizem-que-casos-podem-chegar-a-1-600-em-quatro-dias/ https://cadeacura.blogfolha.uol.com.br/2020/03/18/cientistas-lancam-observatorio-de-covid-19-no-brasil-em-tempo-real-e-dizem-que-casos-podem-chegar-a-1-600-em-quatro-dias/#respond Thu, 19 Mar 2020 00:21:28 +0000 https://cadeacura.blogfolha.uol.com.br/files/2020/03/2020-03-18T205347Z_1558208637_RC2KMF93VQQF_RTRMADP_3_HEALTH-CORONAVIRUS-BRAZIL-320x215.jpg https://cadeacura.blogfolha.uol.com.br/?p=1309 Um grupo de pesquisadores brasileiros lançou nesta quarta (18) o Observatório Covid-19 BR, que, além de apresentar os dados da epidemia em tempo real no Brasil, traz informações como o tempo que o número de infectados leva para dobrar e o número reprodutivo, que indica para quantos outros indivíduos uma pessoa infectada em média transmite o vírus.

Segundo as projeções da ferramenta, com dados de até terça (17), o país terá, em 22 de março, daqui a quatro dias, entre 854 e 1618 pessoas com a doença. A previsão não vai além porque a incerteza para a estimativa seria muito grande —assim com o número de infectados, o tamanho da incerteza cresce exponencialmente.

Um dos cientistas envolvidos é Roberto Kraenkel, professor do Instituto de Física Teórica da Unesp. “ Acreditamos que a máximo de transparência é a melhor política a ser adotada”, diz.

Gráfico e projeção na plataforma nesta quarta (18) (Reprodução)

“É uma iniciativa superimportante e que pode trazer um pouco de senso de realidade para os não crentes na enorme crise que se aproxima”, diz Maurício Nogueira, virologista e professor da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, que não participa do projeto.

É interessante que se montem essas iniciativas, mas é preciso sempre muita cautela em ler os dados. A gente tem visto mudanças no perfil de transmissão desde o surto italiano. Vai ser interessante poder avaliar a validade das predições ao longo do tempo –pode vir a ser um material valioso”, diz Fernando Spilki, presidente da Sociedade Brasileira de Virologia. Ele afirma que  a ferramenta pode ser importante para mensurar o efeito prático de medidas como o distanciamento social.

O observatório não recebeu apoio financeiro direto, mas é tocado por pesquisadores cujos trabalhos são bancados por Fapesp, Capes e CNPq. Os dados são obtidos do Ministério da Saúde e os métodos são abertos para quem tiver interesse. “O que mais necessitamos neste momento é que os dados sobre os casos sejam disponibilizados o mais rápido possível”, diz Kraenkel.

Em média, segundo os cálculos do grupo, no Brasil uma pessoa propaga o vírus para 3,2 outras (com um intervalo de confiança que varia entre 2,3 e 4,4 indivíduos), algo parecido com que vem sendo observado em outros países.

Outra análise que ajuda a entender como está a situação do Brasil é a do tempo que leva para os casos confirmados duplicarem (2,54 dias no país, segundo o cálculo mais recente), é sumarizada no gráfico abaixo:

 

Evolução na velocidade da epidemia em diferentes países; quanto menor tempo de duplicação, mais rápido a epidemia se desenvolve (Vítor Sudbrack/Observatório Covid-19 BR)

“Uma das lições interessantes do gráfico é que há sempre um atraso: os efeitos das medidas de distanciamento social surgem dias após serem tomadas. Isso porque o reflexo no número de infectados é alimentado pelas pessoas ditas em período de incubação, elas já têm o vírus, porém sem sintomas”, diz o físico Vítor Sudbrack, mestrando e pesquisador do Observatório Covid-19 BR.

Segundo Sudbrack, o fato de países europeus apresentarem taxas de duplicação próximas reflete a similaridade das sociedades —estrutura, medidas e protocolos de testagem. “Lentamente, Itália e Espanha estão reduzindo a velocidade de propagação, mas os reflexos das medidas severas tomadas semana passada ainda estão por vir.”

Também é notável a diminuição dessa taxa na Coreia do Sul, reflexo de seu abrangente programa de testagem. O fato de o Brasil ter a política de testar somente casos graves, avalia Kraenkel, introduz ainda mais incerteza nas projeções do observatório.

Já o Irã, um dos países com maior número de infecções e de mortos, teve seu início de epidemia em velocidade altíssima, mas hoje esse número estacionou. A diminuição se deve, diz Sudbrack, a medidas de isolamento tomadas semanas atrás .

“No Brasil, a velocidade de propagação —especialmente em São Paulo e Rio, as regiões de transmissão comunitária— está semelhante à da Espanha, por exemplo. Adotar as medidas de isolamento social é fundamental para que essa velocidade de espalhamento mude até o fim desta semana”, especula Sudbrack.

Uma das questões ainda sem respostas é o impacto de pessoas assintomáticas nessa dinâmica. “Estudos com dados da China mostram que ao menos 25% dos casos teremos origem em alguém sem sintomas, mas que depois os apresentaram”, diz Kraenkel.

Fazem parte do esforço também os pesquisadores Caroline Franco, do IFT-Unfesp; Paulo Guimarães Jr e Paulo Inácio Prado, do Instituto de Biologia da USP; Rodrigo Corder, do Instituto de Ciências Biomédicas da USP e Renato Coutinho, do Centro de Matemática, Computação e Cognição da UFABC, entre outros.


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Em tempos de pandemia, talvez ele esteja mais certo do que nunca. Se você ainda tem alguma dificuldade no tema, vamos tentar resolver isso.

Comecemos com um tipo de crescimento ao qual estamos mais acostumados, o linear. Por exemplo: a cada dia surgem dois novos casos de pessoas infectadas com o novo coronavírus. A relação matemática entre tempo e número de pessoas infectadas recebe o nome de função —no caso, uma função linear. O número de casos pode sempre ser calculado multiplicando o número de dias decorridos por 2.

Mas nem sempre a natureza é tão simples assim. Existem algumas formas de crescimento que se dão de forma mais rápida. Vamos supor que uma função quadrática comandasse essa relação entre tempo e número de infectados: no dia 0, teríamos 0 infectados; no dia 1, teríamos 1²=1×1=1 infectado; no dia 2, teríamos 2²= 2×2=4 infectados; no dia 3, 3²=3×3=9 infectados, e assim por diante; no dia 10, teríamos 10²=10×10=100 infectados. O gráfico ficaria da seguinte aparência (com a função linear para comparação):

A vida real, porém, é ainda mais cruel. O número de infectados costuma crescer de acordo com uma função exponencial, isto é, o expoente é que varia (cresce) ao longo do tempo. Mas o que isso quer dizer? Baseado nos mesmo tempos dos exemplos anteriores seria algo como o seguinte: no dia 0, teríamos uma base b (2, digamos), elevada ao expoente 0, ou seja, b⁰ = 2⁰ = 1; no dia 1, teríamos b¹= 2¹=2; no dia 2, teríamos b²=2²= 2×2=4; no dia 3, teríamos b³=2³=2×2×2=8; no dia 10, teríamos b¹⁰=2¹⁰ =2×2×2×2×2×2×2×2×2×2=1.024 infectados. Já deu para ter uma ideia de que a curva exponencial pode ser muito maior do que a curva quadrática, certo? Vejamos no gráfico abaixo:

A seguir vamos apresentar um exemplo gráfico de como o começo da epidemia está se desenrolando na Itália, que já superou a marca dos 24 mil infectados (para quem estiver interessado, a função ajustada é esta: y= 3,28*exp(0,2x), em que x é o número de dias e y é o número de infectados; ainda não há dados brasileiros suficientes que permitam fazer uma comparação adequada, mas até agora não há qualquer razão para achar que estamos melhores que o país da bota.)

A partir desse exemplo também dá para entender como algumas medidas podem ajudar a frear a epidemia —como identificação rápida de doentes e isolamento adequado. No início, observa-se há pouca diferença. mas veja o efeito pronunciado depois de uns 20 dias (a função seria y=3*exp(0,18x)):

É esse tipo de cálculo que justifica o alerta de especialistas para a necessidade de adotar rapidamente medidas que contenham a disseminação do vírus, assim achatando a curva epidêmica da Covid-19.


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Pesquisadores da China analisaram 1.070 amostras biológicas de 205 pacientes infectados, que, em média, tinham 44 anos de idade. A maioria apresentava febre, tosse seca e fadiga. Eles estavam internados em hospitais nas províncias de Hubei e Shandong e na cidade de Pequim.

As amostras podiam ser as seguintes::

  • lavado broncoalveolar (soro fisiológico é instilado e aspirado do pulmão, 93%)
  • esfregaço nasal  (63%) ou da faringe, (32%)
  • catarro (75%)
  • biópsia do pulmão (46%)
  • fezes (29%)
  • sangue (3%)
  • urina (0)

Os valores entre parênteses mostram a fração de amostras positivas para a presença do vírus em cada categoria.

Como era de se esperar, o patógeno é muito presente em amostras do trato respiratório. A grande surpresa é a existência de partículas nas fezes.

“É importante ressaltar que o vírus vivo foi detectado nas fezes, o que implica que o Sars-CoV-2 pode ser transmitido pela via fecal. Uma pequena porcentagem de amostras de sangue apresentou resultados positivos no teste de PCR [que amplifica o material genético e identifica a presença do vírus], sugerindo que a infecção às vezes pode ser sistêmica”, escrevem os cientistas.

“A transmissão do vírus por vias respiratórias e rotas extrarrespiratóriaspode ajudar a explicar a rápida disseminação. Além disso, o teste de amostras biológicas distintas pode melhorar a sensibilidade [casos corretamente classificados como positivos] e reduzir número de falsos negativos.”


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Já se sabia há tempos que uma das principais formas de transmissão de germes é pelo contato com pessoas infectadas, mas não havia um experimento que fizesse a comparação entre as diferentes modalidades.

A referência é o aperto de mão moderado, marcado como 100%. Em relação a ele, um aperto de mão vigoroso chega a transmitir o dobro de bactérias (o teste foi feito com bactérias E. coli não patogênicas). Um high-five, cumprimento com as mãos espalmadas, transmite um pouco menos. Por fim, um soquinho, ou “fist bump”, transmite apenas uma pequena fração das bactérias, menos de um quarto do cumprimento-referência.

Comparação entre a transmissão de bactérias entre diferentes formas de cumprimento com as mãos (American Journal of Infection Control/Reprodução)

A conclusão é que, além da superfície de contato, a duração do cumprimento e a força empregada também influenciam no espalhamento dos micróbios.

Os cientistas alertam que outras variáveis podem atuar na transmissão: partes diferentes da mão podem abrigar micróbios distintos e em diferentes quantidades; a localidade pode influenciar no tipo de germes a serem transportados, assim como a profissão; e os hábitos de higiene têm um papel crucial, por motivos óbvios.

“Embora tenhamos investigado a transferência de uma bactéria não patogênica, seriam esperados resultados semelhantes para outros microrganismos patogênicos (incluindo vírus como o influenza), alguns dos quais são muito custosos em termos humanos e econômicos. […] É improvável que uma saudação sem contato possa suplantar o aperto de mão; no entanto, para melhorar a saúde pública, incentivamos a adoção adicional do ‘fist bump’ como uma alternativa simples, gratuita e mais higiênica ao aperto de mão”, escrevem no artigo.

Em tempo de coronavírus, é uma dica de ouro.

Curiosamente nesta terça (10) o primeiro ministro holandês, Mark Rutte, advogou pela suspensão dos apertos de mão. Ele contudo, esqueceu da regra que acabara de estipular e deu a mão a Jaap van Dissel, chefe do Instituto Nacional de Saúde Publica e Ambiente do país. Veja o vídeo abaixo:


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O primeiro conceito importante é o de endemia. Trata-se de uma certa quantidade de casos que historicamente já ocorrem em determinada região do país. Exemplos brasileiros: doença de Chagas e esquistossomose (barriga d’água).

Quando esse nível endêmico (que pode ser 0) é rompido pelo aumento de casos, pode-se considerar que há um surto ou uma epidemia

Geralmente fala-se em “surto” para designar que novos casos estão concentrados em determinada região, como um bairro de uma cidade ou uma região metropolitana. 

A palavra “epidemia” costuma ser reservada para quando a delimitação geográfica (uma vila ou um bairro, por exemplo) já não ajuda a definir tão bem onde os casos da doença estão acontecendo e/ou quando muitas pessoas são afetadas.

A distinção é algo cinzenta, mas uma infecção que pode ajudar a ilustrar o problema é o sarampo. Os surtos recentes de sarampo mataram 140 mil pessoas só em 2018, segundo a OMS. Calcula-se que as epidemias de sarampo na década de 60 chegaram a matar 2,5 milhões de pessoas.

Quando a epidemia afeta vários países ou continentes, trata-se de uma pandemia. Um caso ou outro de uma doença fora do local onde houve inicialmente o surto não implica necessariamente uma pandemia. Outros fatores, como a capacidade de disseminação do agente infeccioso (como no vírus da gripe) e presença de vetor (mosquito Aedes aegypti, no caso de arboviroses como dengue e zika) contribuem para a contenção ou espalhamento da moléstia.

Mas em que momento exatamente uma grande epidemia se transforma numa pandemia? Quantos países têm de ser afetados? Em que proporção? A gravidade da doença importa?

Há um consenso de que a gripe espanhola, que há cem anos matou pelo menos 50 milhões de pessoas, pode ser chamada de pandemia. Também se diz que o surto de gripe suína, em 2009, que matou 200 mil pessoas em todo o mundo, foi uma pandemia. 

Em um artigo publicado no periódico The Journal of Infectious Diseases, em 2009, os autores, entre eles Anthony Fauci, diretor do Niaid (Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos EUA) fazem uma reflexão do que seria necessário para atestar esse patamar extremo:

  • Grande distribuição geográfica: um dos consensos é que a doença tem que afetar uma grande porção territorial, como no caso da peste negra, da gripe (influenza) e de HIV/Aids.
  • Rastreabilidade do movimento da doença: é possível identificar para o caminho percorrido pela doença, como no caso da influenza, transmitidas por via respiratória, da cólera, pela água, ou da dengue, que se dá de acordo com a presença de vetores (mosquitos do gênero Aedes).
  • Alta taxa de infecção: quando a taxa de transmissão é fraca ou há baixa proporção de casos sintomáticos, raramente uma doença é tratada como pandemia, mesmo com grande disseminação. A febre do Nilo Ocidental saiu do Oriente Médio e foi parar na Rússia e no Ocidente em 1999, mas nunca carregou a alcunha de epidemia
  • Imunidade populacional baixa: É maior a chance de haver uma pandemia quando a imunidade da população for baixa para o patógeno
  • Novidade: o uso do termo pandemia está associado ao risco de novos patógenos (caso do HIV, nos anos 1980) ou novas variantes (caso do vírus influenza, da gripe, que apresenta sazonalmente novas configurações)
  • Infecciosidade: o termo “pandemia” é menos comumente ligado a doenças não infecciosas, como obesidade, ou comportamento de risco, como tabagismo. Quando isso ocorre, a ideia é destacar aquele problema como uma área que merece atenção, mas, segundo os autores do artigo, trata-se de um uso coloquial, não tão científico.
  • Tipo de contágio: a maioria dos casos de epidemias é de doenças transmitidas entre pessoas, como a gripe (influenza).
  • Gravidade: geralmente a palavra “pandemia” é associada a moléstias graves, capazes de matar, como peste negra, HIV/Aids e SARS (síndrome respiratória aguda severa). Mas doenças menos severas, como sarna (causada por um ácaro) ou conjuntivite hemorrágica aguda (provocada por vírus), também foram consideradas pandemias.

A principal forma de se prevenir contra os efeitos de uma pandemia é com sistemas vigilância para detectar rapidamente os casos, ter laboratórios equipados para identificar a causa da doença, dispor de uma equipe habilitada para conter o surto, evitando novos casos e sistemas de gerenciamento de crise, para coordenar a resposta.

A OMS (Organização Mundial da Saúde), por sua vez, emprega termos específicos para classificar certas situações. Uma emergência se dá quando uma autoridade decide que é hora de tomar medidas extraordinárias, como restrição de viagens e de comércio e estabelecimento de quarentena. Essa mesma autoridade também pode suspender esse estado de emergência. Geralmente uma emergência é bem-definida no tempo e no espaço e depende de um certo limiar para ser declarada. Esse limiar pode ser definido como uma taxa de mortalidade de 1 para cada 10.000 pessoas por dia ou mortalidade de 2 crianças abaixo de 5 anos a cada 10.000 pessoas por dia.

Crise é uma situação classificada como difícil, difícil de se estudar, classificar e combater. Uma crise pode não ser necessariamente evidente e necessita de um trabalho de análise para ser totalmente conhecida e e combatida.

Outras fontes consultadas: Ministério da Saúde, Fredi Alexander Diaz Quijano (Faculdade de Saúde Pública – USP), CDC


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